segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

_Partido calado.

Você pode ter tudo aquilo que quiser...
Desde que seja pequeno como o seu mundo
E enorme como o seu desejo.
Quando as paredes te abraçam em seu ninho
E um passaro azul diz que o dia é bonito.

Você pode ter tudo aquilo que quiser...
Mulheres, granadas, livros, um bom litro de vinho.
Desde que sua casa amarrotada de dores te expulse.
Desde que a sua vizinha plante rosas e roupas sujas no varal.

Você pode ter tudo aquilo que quiser...
Ter a chave de casa, o quarto arrumado, um isqueiro da Bic.
Se há d’ outro lado alguém na espera
Um Rio que banhe a tua carne flácida
O tempo espera

Você pode ter tudo, ou quase tudo...
O nada faz pouco caso de você.

emmanoel Cardoso.

sábado, 12 de dezembro de 2009

_A Hora da Partida



Vi dois cachorros deitados na rua. Duas rubras insígnias tatuadas no passeio público. Olhares oblíquos ondulando os ares, fazendo carícias nas minhas orelhas agudas. Cá dentro uma rapariga com seus cotovelos trepados na mesa, insinuando seus lábios em falas manhosas.
Aquela paisagem dengosa, uma pérola negra vestida de branco, chorosa de medo da minha partida.
Perguntou-me: - Tu ficas?
Respondi, com um sorriso sarcástico de canto de boca: - Tu sentirás saudades?
Era súplica todo o seu corpo, era um pesar misturando-se aos pratos estampados em cima da mesa. Bati a porta, olhei as coisas de fora. Sem dó, remorso, piedade.
Naquele dia senti saudade, fiquei deitado na cama, sonhando, acordando.

emmanoel cardoso.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

_ A Bola da Vez
Bilhar da fadiga...
Seis bocas em ópio.
cansar de ter hora:
Dorme Acorda
Trabalha Estuda
Namora e
Tic-Tac Boom.
emmanoel cardoso

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

emmanoel cardoso
Nunca fui afeito a dramatizações, nem sempre fui seco por dentro, e sim vazio por rasos amores. Talvez fosse a flâmula de um desejo ardente, escondido, perene, a embriagar as minhas certezas que mudavam meus planos e todo o sentimento grandiloquente tornava-se marola a empurrar conchas perdidas do mar à mão vazia de um trovador errante.

Quem dera fosse coisas de gênio, como dizem os mais caducos, quiçá nunca me adequei às minhas próprias finuras, jamais me fartei de beijos e caricias rogada a São-sei-lá. Não tinha motivos para reflexões profundas, não via senão o ponteiro das horas girando e em segundos meu senso de amabilidade e afeto se tornavam turvos; como o passar dos dias para as noites. Não me magoava, acreditei que assim se sucediam aos outros, como se todos fôssemos feitos daquilo que havia presente, o intervalo entre o beijo e o abraço, a mão dentre as coxas e o grito de gozo final. Tolo engano! Fui sempre oposto, nem me dei conta que eram os atos que ditavam os gostos e aflições alheias. Minhas palavras eram pelicas, mas os gestos eram crus e ralos. Fel que azeda boca de doente.

Magoar era verbo presente. Do passado não havia senão nódoas; manchas suaves e sublimes que se desmanchavam sem que desse por conta. Não era por minha culpa, foram as coisas todas que não se inclinaram ao meu modo insensato e ingênuo de abraçá-las. Queria tudo hoje, amanhã desejava somente uma parte ou talvez nada, nem sei. O fato é que o mundo continuava ali, girando ao meu redor, criando expectativas daquilo que ainda nem havia notado; cobranças mudas aos meus ouvidos surdos.

É que estando em meio ao furor de toda e qualquer novidade, quando a chama da vela ainda acesa aumentava, crispando-se até não haver mais base que a sustentasse, corria e catava a luz mais próxima, um jazigo talvez, só pra não ter que estar horas sem prumo. Ficar olhando o teto a noite inteirinha, pensando na corja de gente que se quer imaginava ter um homem chocado, agarrado ao descaso, a arquitetar frases perfeitas que não brotavam nas horas próprias.

Àqueles todos que se faziam próximos, o amargo meu da solidão foi sarcasmo, cansaço de me repetir, mostrar-me absorto, por não ter que dar-lhes motivos que explicassem os meus planos. Estava mesmo fadado ao pecado do abandono...

Tinha cá dentro um desejo ardente, pulsante de possuir todas as coisas de uma só vez, de mastigá-las e cuspi-las em sumo mascado, triturado, fatigado das dores mordentes. Era pra ter prumo, cadência de ritimista, mas não; era descompassado, o pato feio que brincava no escuro pra não ter de olhar no espelho da candura.

Prendia-me ao futuro e recordava do passado como se o tempo pudesse amarrá-los. Pra que a dor fosse mais breve, já que teria de senti-la e amargá-la profundamente, brincava e não contava as memórias remanescentes, era uma dor passada, soterrada em desejo.
Continua... ( Não sei quando e nem onde).

sexta-feira, 17 de julho de 2009

_FOTORRAGIA fala sobre OS LADOS URBANOS

e dos mares de ferro que abarrotam as avenidas, dos homens asfaltados que atravessam diariamente as esquinas sujas, da cidade nublada de fumaça e frio. dos encontrões nos elevadores, das gentes de fome e gravata, das arquiteturas insones e da solidão no afã do cosmopolitismo por 19 fotógrafos brasileiros:

Boris Kossoy

Milton Montenegro

Milton Dória

Marcelo Tabach

Lalo de Almeida

Juvenal Pereira

Gaspar Gsparian

Claudio Edinger

Aníbal Philot

Edgar Moura

Vidal Cavalcante

André Dusek

Domingos Peixoto

Paulo Fridman

Walter Carvalho

Agnaldo Ramos

Salomon Cytrinowics

Cristiano Mascaro

Thomas Farkas

segunda-feira, 25 de maio de 2009

_Depois de Hoje


Eis que a vida dá sua graça
Eis que ela passa
Me olhando abestada
Sem graça
Sem ter hora nem lugar.

nasce, cresce e morre...
nasce, cresce e morre...

Depois de passar do lugar
Sem hora, sem graça
Oh vida abestada!

cresce, nasce e morre...
cresce, nasce e morre...

emmanoel cardoso

sexta-feira, 22 de maio de 2009

_CAROS AMIGOS

emmanoel cardoso
Sempre andei sozinho, tive muitos amigos que foram se dispersando aos poucos e, ao termino de cada historieta, fiquei a ver navios, acreditando piamente que a cada nova descoberta, residiam os momentos mais relevantes dos meus dias.

Passei a enxergar em muitos dos meus fieis confidentes, a malicia necessária que deveria ter, e o mau de um bem que me tornaria o canalha pedantesco que me subjaz à espécie humana. Admiti que fossem eles os moderadores dos meus passos longos e apressados, donos dos ouvidos adestrados para a concórdia, eram mesmo os apaziguadores de minhas canalhices, das minhas tolices de rapaz cortejador.

Éramos os abraços mais apertados, bebíamos os licores mais doces que a vida nos oferecia, e ao mesmo tempo, fitávamos olhares de repúdio quando o outro sorria o seu mais terno sorriso. Nunca chorei tais perdas, mas sofria sempre a hora da partida, ficava um tanto chocado quando sentia a fragilidade que tinham aquelas horas arrastadas no tempo.

Acusava friamente o outro pelo abandono, nunca admiti ser o responsável pelas perdas que se sucediam. Quando os motivos que nos eram caros iam escorregando levemente e, estando despercebido do acontecido continuava buscando aconchego, rugia a onipresença, pois, caso o meu egoísmo gritasse lá de dentro, poderia rodear-lhes as pernas como um felino á procura de carinho. Ou melhor, espernear-me-ia como criança birrenta que quer um pirulito maior que o preso à mão.

Imagino que nunca irei descobrir como quão grande era o afeto que emanava e jorrava a golfadas, num espaço tão pequeno, tão modesto, simples como um vaso vazio que apara as goteiras num dia chuvoso, numa casa mofada à beira do nada.

Vinha à tona que o caos é quem rege o mundo e que o tempo sempre seria, como antes, o senhor de todas as danças.

Recuei um instante e vi que nada me cabia, o silêncio dizia as coisas necessárias, não ouvia por achar que as amarras da amizade bastavam e respondia, mesmo sem haver perguntas, tudo aquilo que poderia causar confronto imediato.

Sei agora que não havia causas, não existe nada que nos prenda, por mais forte que sejam as cordas
.